Entre aparências e essências

Francisco Celso Calmon

Enquanto país imperialista, os EUA continuará sendo, independente do governo, seja com Kamala, seja com Trump, mas, entre caretas e sorrisos, entre macho alfa e mulher segura do seu papel de gênero, entre o branco germânico e a mestiça, existem diferenças. Não devemos reduzi-las e ficarmos míopes.

A diferença entre a extrema-direita e a direita não são os objetivos, mas a forma de alcançá-los e mantê-los.

O neonazifascismo no mundo cresce porque tem o apoio político explícito ou logístico do imperialismo.

Mesmo não havendo uma diferença ideológica entre Kamala e Trump, existe diferenças políticas e de articulações e preferências nas relações internacionais, é esse aspecto que o Trump significará um sopro para a sobrevivência do bolsonarismo.

 Trump constituirá um prócer do neonazifascismo internacional, Kamala ainda é uma incógnita, pois, não dá para simplificar que será continuidade do Biden, ela mesma declarou que ela é Kamala, nem Biden e nem Trump, portanto, independente de quem ganhe as eleições nos EUA, é emergente e imprescindível a constituição de uma  Frente anti-imperialista, formada por partidos de esquerda e progressistas, movimentos sociais, estudantis, com o beneplácito dos governos democratas, especialmente da América Latina. 

O meu artigo publicado em três sites de comunicação, na semana passada, teve por título “Denúncia e o estrago na vida” – ou “Calúnia e difamação na política: exoneração e repercussões” neste site – e versou sobre a exoneração e o julgamento moral do ex-ministro de Direitos Humanos, Silvio Almeida, e recebeu mais de vinte comentários, o que me levou a fazer algumas considerações, como segue.

Joaquim Barbosa, algoz do “mensalão”, foi escolhido por sugestão de Frei Beto, que mal o conhecia, atendendo a um pedido do Lula que queria a indicação de um jurista negro.

O primeiro homem negro no STF mostrou-se um punitivista raivoso e recalcado, agora um negro no governo Lula 3 é linchado moralmente.

Entro no questionamento: qual a intenção da Ministra Anielle Franco ao decidir dar início a tal denúncia do modo que deu? Ou seja: por que não escolheu o caminho legal e delegou a uma ONG americana fazer a delação? Por que o governo num processo sumário o demitiu, quando acusações de corrupção a quadros desse mesmo governo estão protegidas pelo contraditório e ampla defesa e no timing da justiça? Por que assessores do Presidente, inclusive a sua militante esposa, sabiam, anteriormente a notícia da Me Too, e não tomaram providências para evitar o viés perverso e desgastante da pauta de DH e do governo? Prevaricaram?

Acusado sem conhecer o teor das acusações, sem o contraditório minucioso, sem a ampla defesa, com uma ministra que liberou para a ONG internacional a divulgação, parece com aquelas fogueiras de reputações e justiçamentos do Estado marginal, sem entrar no mérito das acusações, a forma foi estranha.

Lendo pedaços da comunicação virtual entre Silvio e Anielle, fiquei pasmo diante de tanta imaturidade nesse imbróglio, que é difícil crer que o governo esteja à altura da conjuntura nacional e internacional, na qual os DDHH estão em rota de colisão fatal com o movimento neonazifascista mundial.    

Se é com o poder que as pessoas se mostram verdadeiramente, parece que o governo agasalha adolescentes ginasianos em quermesses de parques de diversão oferecendo flores e beijos e agora caretas.

Em lugar da justiça, deu à mídia, ONG Me Too, uma carta na manga. De jogar para o público, antes mesmo de ouvir o acusado.

Seria o objetivo da ONG americana, do sensacionalista Metrópoles, e outros envolvidos diretamente, o da mortalha moral à preciosa pauta de DDHH, visto que o sufoco orçamentário é o outro lado da mortalha? Se sim, então, foi malevolamente exitoso e os golpistas e vivandeiras das conspirações se regozijam e não agradecem.

As consciências identitárias não deveriam sobrepor à consciência de classe, consciência essa sine qua non para o enfrentamento à ideologia dominante.

Em qualquer contraditório, há interesses implícitos além dos aparentes; há muita intriga e um ambiente tóxico nesse governo cheio de contradições internas e disputas de poder, onde uns remam para um lado e outros para outro, onde uns são patrocinados e outros também.

Quem está perdendo nesse imbróglio, senão negros, mulheres, enfim, os direitos humanos?

No governo Dilma, a Globo denunciava supostos casos de corrupção e a Presidenta exonerava incontinente o denunciado. No Lula 3 as conspiratas nascem internamente.

A revolução dos costumes ocorre por luta política e de gerações, é um processo lento de surgimento do novo e caducidade do velho, com antinomias intrínsecas, por isso, deve-se evitar cair no moralismo pequeno-burguês e compreender como evolução cultural, na qual o aceito ontem, não é mais hoje, alguns viraram delituosos tipos penais.

Cercado por fora, minado por dentro, precisamos todos estarmos atentos, unidos e equilibrados na defesa das pautas democráticas desse governo.   

Cinco governos, Lula/Dilma, erros e acertos, golpes e tentativas, a história registra e ensina, contudo, é mister ter vontade de APRENDER.


Francisco Celso Calmon

Ex-coordenador nacional da Rede Brasil – Memória, Verdade e Justiça; membro da Coordenação do Fórum Direito à Memória, Verdade e Justiça do Espírito Santo. Foi líder estudantil no ES e Rio de Janeiro. Participou da resistência armada à ditadura militar, sendo sequestrado e torturado. Formado em análise de sistemas, advocacia e administração de empresas. Foi gestor de empresas pública, privada e estatal. Membro da Frente Brasil Popular. Autor dos livros “Sequestro moral e o PT com isso?” e “Combates pela Democracia”, coautor dos Livros “Resistência ao Golpe de 2016” e “Uma sentença anunciada – O Processo Lula”. Sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo. Articulista de jornais e livros, coordenador do canal Pororoca.



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