Motta convocou um matador para relatar a PL da Anti Facção.

Francisco Celso Calmon

Por vários meses consecutivos, a nação brasileira tem sido continuamente insultada pela atual composição do Congresso, com diversas demonstrações de aversão ao bem-estar social.

Na entrevista de Hugo Motta e Guilherme Derrite sobre a minuta do relatório, uma cena foi sinal de manipulação, um tipo de censura, onde as perguntas DOS JORNALISTAS direcionadas a eles não eram ouvidos, somente as respostas deles, então, os telespectadores não tenham como fazer uma reflexão analítica.

A pergunta para a qual não há resposta factível é porque Motta trouxe um deputado licenciado, com ficha borrada, para a relatoria de um projeto do governo, responder que não havia outro capacitado é achincalhar os demais deputados.

Hugo Motta teve sua imagem tecida a partir de uma herança política familiar. Essa herança, há mais de um século domina Patos, no sertão paraibano, e transformou a política local em negócio de compadres. Filho, neto e bisneto de prefeitos e deputados, Motta herdou não apenas o sobrenome, mas o sistema de poder que sustenta o clã.

O atual presidente da Câmara gosta de repetir que a sua força está na capacidade de diálogo. É o político que fala com todos, que se diz “de centro”, que encarna o discurso da conciliação em tempos polarizados. Mas esse verniz é apenas a camada mais superficial de um projeto de poder antigo e bem conhecido no Brasil. Usa de platitudes para engabelar crédulos.

Apadrinhado por Arthur Lira, o jagunço institucional de Alagoas, Motta se consolidou como peça de sustentação da engrenagem que mantém o Congresso sob domínio da direita e adversa do governo, mesmo quando finge equilíbrio.

Sua eleição à presidência da Câmara com apoio simultâneo do PT e do PL foi celebrada como símbolo de conciliação, mas traduziu o oposto.

Motta é a reafirmação de um bloco que sobrevive encenando neutralidade enquanto preserva o poder dos conservadores.

O autoproclamado “conciliador” é, na prática, um operador a serviço dos mesmos interesses que garantem ao centrão seu poder e à extrema-direita a sua ascensão

A decisão de Motta de nomear Guilherme Derrite, ex-secretário de Segurança do governo Tarcísio de Freitas, para relatar o Projeto de Lei Antifacção é a prova disso.

A escolha de um bolsonarista de farda, com discurso autoritário e passado de alta letalidade, não tem nada de neutra. É um gesto calculado, ideológico, que demarca território e reafirma um padrão conhecido. A Câmara dos Deputados segue sob o comando de quem prefere acenar à direita.

O secretário Guilherme Muraro Derrite nasceu em Sorocaba em 1984. Ingressou na Polícia Militar em 2003 e se formou como bacharel em Ciências Sociais e Segurança Pública pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco.

Atuou como tenente nas Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (ROTA) de 2010 a 2013. A ROTA, mais que uma tropa, é uma instituição com cultura própria, marcada pela autopercepção de ser a “última trincheira” contra o caos

Derrite internalizou e amplificou essa cultura, transformando a alta letalidade em um valor profissional e, posteriormente, em capital político. O “excesso de mortes em serviço” teria sido justamente o motivo que levou Derrite a ser afastado de suas atividades na corporação. Ele confirmou ao conceder uma entrevista para um canal do YouTube em 2021, criando provas contra si mesmo, reafirmando suas tendências assassinas: “Porque eu matei muito ladrão. A real é essa, simples. Pa! Troquei tiro várias vezes, e uma atrás da outra. Acabou incomodando não sei quem, mas veio a ordem de cima para baixo, questão política: ‘Tira o Derrite da Rota’. E fui convidado a me retirar.”

Sua transição para a política foi o próximo passo que virou lógica da extrema-direita quando precisa fortalecer seu domínio em cada fresta da democracia.

Derrite levou para a mesa do parlamento a lógica da “guerra”, do extermínio, que praticava nas ruas.

Cada um dos sete inquéritos por homicídio e as 16 mortes associadas, longe de serem um segredo vergonhoso, foram meticulosamente convertidos em sua marca registrada.

Derrite é a personificação de uma política da morte, que se tornou uma plataforma eleitoral bolsonarista, e, seguindo essa lógica, elaborou o relatório do PL Antifacções, o intuito dele e do Motta era botar mais fogo na polarização. Quase conseguiram, eles saíram chamuscados.

Sob o pretexto de combater o crime organizado, o texto original do seu relatório propunha submeter a Polícia Federal ao controle dos governadores, transferindo o comando da segurança para figuras como Tarcísio de Freitas e retirando do governo federal um instrumento essencial de investigação. A medida não foi puramente técnica, mas uma tentativa de concentrar poder e blindar governos estaduais do escrutínio público de suas matanças.

A segurança pública é nacional.

O crime organizado é formado de interfacções do crime, como os Amigos dos Amigos, Comando Vermelho, Terceiro Comando, Primeiro Comando da Capital, Primeiro Comando Mineiro, Paz, Liberdade e Direito, Comando Norte/Nordeste. São nomes de facções criminosas espalhadas de Norte a Sul do país. E deve haver outras.

A Operação Carbono, por exemplo, ao investigar “relações promíscuas”, teria “assanhado” o comando da extrema direita, provocando uma reação direta ao trabalho da Polícia Federal.

“A Operação Carbono Oculto tem sido apresentada por autoridades fiscais e policiais como a maior ação integrada contra o crime organizado no setor de combustíveis […] o desdobramento “Carbono Oculto 86” interditou 49–50 postos no Piauí, Maranhão e Tocantins, mapeando uso de empresas de fachada, fintechs e fundos, com R$ 5 bilhões em movimentações atípicas e apreensão de bens e uma aeronave.”

“O sucesso da operação provocou uma rápida reação da ultradireita. Primeiro, com as chacinas da Penha e do Morro do Alemão, uma ação articulada entre o governo do Rio, polícia e Ministério Público Estadual, seguido de um apoio imediato de quatro governadores de direita – Ronaldo Caiado, Tarcísio de Freitas, Romeu Zema e Jorginho Mello.” (GGN).

Derrite também buscou enquadrar facções criminosas como organizações terroristas, reforçando a retórica de guerra que transforma qualquer operação em campo de batalha e legitima o uso desmedido da força e facilita ingerência de Trump.

A LEI Nº 13.260 de nossa constituição define o terrorismo (Art. 2º) como a prática de certos atos por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito (de raça, cor, etnia e religião), com a finalidade de provocar terror social ou generalizado.

Logo, o terrorismo, nessa lógica insconstitucional de Derrite, é a palavra que autoriza o Estado a agir sem limites, ignorando por completo o fato de que facções criminosas são categorizadas como tais porque visam o lucro, que é o caso das facções ques estão no alvo da extrema-direita. Não há cenário lógico para afirmar que elas priorizam o terror generalizado acima do benefício financeiro. Por isso mesmo tem ligações com a “faria lima”.

Motta está se posicionando como o grande articulador da direita pós-Bolsonaro. Ao dar a Derrite (e, por tabela, a Tarcísio) a relatoria do projeto de segurança do governo, ele faz um investimento de alto retorno, porém, até o momento o tiro saiu pela culatra.

A insistência em debilitar financeiramente a Polícia Federal e as demais forças de segurança da União com o desvio de recursos para fundos estaduais, em vez de focar em descapitalizar o crime organizado só reforça seu desejo de enfraquecer a estrutura federal para fortalecer os feudos estaduais, e mais: a descentralização e as divisões por estado é a estrutura atual que fracassou.

O relatório de Derrite, mesmo após o falso recuo sobre a Polícia Federal, permanece carregado de retrocessos inaceitáveis, conforme denunciou o Ministério da Justiça hoje.

O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias, fez críticas pontuais sobre a nova versão do texto de Derrite. “o texto promove uma fragmentação orçamentária em relação aos fundos que compromete a eficiência no enfrentamento às organizações criminosas de atuação interestadual”.

“O substitutivo também desmonta a política de descapitalização das facções ao eliminar as medidas cautelares especiais previstas no projeto original, substituindo-as por instrumentos já existentes e criando a ficção de uma ‘ação civil autônoma’, que só acrescenta morosidade, insegurança jurídica e pulverização dos procedimentos de recuperação de bens”, crítica, ainda, Lindbergh. (Fonte: CCN.)

Derrite não recuou, foi empurrado, e Motta levou gol, ficou escancarado que é não é um presidente imparcial na Câmara, é um militante da extrema-direita. Se não prepararmos esculacho a ele nas ruas, ainda vai aprontar outras à medida que as eleições fiquem mais próximas.

Quem tem medo do trabalho da Polícia Federal?


Francisco Celso Calmon

Ex-coordenador nacional da Rede Brasil – Memória, Verdade e Justiça; membro da Coordenação do Fórum Direito à Memória, Verdade e Justiça do Espírito Santo. Foi líder estudantil no ES e Rio de Janeiro. Participou da resistência armada à ditadura militar, sendo sequestrado e torturado. Formado em análise de sistemas, advocacia e administração de empresas. Foi gestor de empresas pública, privada e estatal. Membro da Frente Brasil Popular. Autor dos livros “Sequestro moral e o PT com isso?” e “Combates pela Democracia”, coautor dos Livros “Resistência ao Golpe de 2016” e “Uma sentença anunciada – O Processo Lula”. Sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo. Articulista de jornais e livros, coordenador do canal Pororoca.



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