
Lula subiu a rampa sim. Subiu e subiu bonito, sob um surpreendente céu azul de nuvens luminosas, contrariando a ameaça de chuva pesada e do sol negro que nos amedrontava de muitas formas. Subiu sem tropeçar nas pragas rogadas pelos bolsonaristas ensandecidos em frente aos quartéis, órfãos do mito decrépito que bateu em fuga. Subiu emocionado e, para surpresa de milhões, levou pela mão o povo brasileiro.
E nós choramos, choramos sim, ali no gramado, tomados pela alegria e nos dizendo que foi possível sim, e foi duro sim, que foi preciso irmos para as ruas tantas vezes com faixas e bandeiras, sob sol e chuva, panfletando e falando e gritando até quase perder a voz. Finalmente, ao vivo ou diante do telão, vimos o presidente subir a rampa. Nós, a multidão quase incrédula, em comoção e festa. Algumas vezes corri os olhos em volta e vi mãos de todas as idades enxugando lágrimas, olhos úmidos em rostos jovens, rostos cansados, e nos olhávamos extasiados diante do espetáculo.
Lula subiu a rampa sim, também emocionado, a voz embargada ao falar das injustiças sociais. Sabe que não será fácil governar. Sabemos. Foi preciso costurar uma frente ampla diversa e heterogênea, mas também com aliadas grandes e dignas como Marina Silva e Simone Tebet e Alckmin, e povos indígenas, e negros e quilombolas e tantos outros, para vencer nas urnas o mais sórdido uso da máquina pública e a ameaça de fascismo que já vimos.
Vai ter dificuldades para governar? Claro. Muitas. Tem de conciliar o socorro a emergências com a garimpagem de recursos, no velho malabarismo de não gastar muito mais do que se arrecada.
Mas que alívio! Que alívio vê-lo assinar imediatamente medidas para coibir o malfadado derrame de armas e munições patrocinado pelo infame derrotado. E já desencadear ações de transparência, para esquadrinhar com lupa e retirar os tampões dos sigilos criminosos. Não precisamos de armas nem sigilos. Precisamos de transparência, eficiência, comida, SUS, educação, ciência, cultura, justiça social, bem-estar para todos.
Lula subiu a rampa e era uma urgência. Que retorne assim, calejado, mais velho, mais maduro, mais experiente, mais alerta contra os que, no seu entorno, a pretexto de manejar o bem público, queiram se locupletar. De olhos muito abertos. De coração e mente alertas, pulsando competência e dignidade nos seus 77 anos. Que possa reconstruir e reconciliar esse país dilacerado, triste e perigosamente dividido.
Madalena Rodrigues
Jornalista e escritora. Seu lançamento mais recente é o romance O CHEIRO, ficção que trata das mazelas brasileiras e da condição feminina. Mora em Brasília e integra o movimento GERAÇÃO 68. Doutora em Teoria Literária pela Universidade de Brasília.

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