PIETÁ – Dilson Cunha

A semelhança entre o Cristo Morto, de Holbein, e o índio Yanomami não é mera coincidência. Ambos estão despidos de suas humanidades bem como de suas divindades. Ambos trazem no semblante a dor do abandono. Ambos, cadavéricos e rígidos, estão carregados de sofrimento e putrefação. Ambos, insepultos.

Diante do Cristo Morto de Holbein, Dostoiévski, estático por cerca de quinze minutos, emudeceu e teve sintomas de epilepsia sem ser epilético. Como ficar indiferente? Como ignorá-lo?

Diante do índio moribundo estamos nós, e não há como fugirmos dele, fingirmos que não o vimos. Vimos! E em carne e osso. Pouca carne, muito osso. Carregado de muitas e indizíveis dores.

Ah, sim, ouso parafrasear o profeta Isaías:
“[…] não tinha beleza nem formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, homem de dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum”.

Aí você me dirá: é sobre Cristo que Isaías está falando.

Daí eu lhe direi: sim, eu também. Porque quem não viu Jesus nesse Yanomami não o verá em nenhum outro lugar.

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Dilson Cunha é Arquiteto, artista plástico e bacharel em História.

Texto originalmente publicado no diariodocentrodomundo.com.br


Respostas

  1. Avatar de MADALENA CASTILHO CASSIANO

    Matéria excelente A comparação entre Jesus e o índio Yanonami
    perfeita porém lastimável.

  2. Avatar de Lena Galvão

    Estou em profundo desgosto e tristeza. Como podemos ignorar a realidade e o olhar para o outro? Quem somos de verdade? Monstros?

  3. Avatar de Maria Selma de Castro Araujo

    A história se repetindo, na ação ou omissão do homem.

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