A curta frase do título, de autoria do jornalista Luis Nassif, sintetiza o momento que o Brasil vive do ponto de vista econômico e fiscal. Até mesmo economistas liberais como André Lara Resende (um dos idealizadores do Plano Real), Monica de Bolle e Nelson Marconi, entre outros economistas de peso, se posicionaram contrários a essa política monetária de alta taxa de juros, mantida pelo Banco Central, num manifesto em que afirmam:
“A taxa de juros no Brasil tem sido mantida exageradamente elevada pelo Banco Central e está hoje em níveis inaceitáveis. O discurso oficial em sua defesa não encontra nenhuma justificativa, seja no cenário internacional ou na teoria econômica, e o debate precisa ser arejado pela experiência internacional. Nenhum dos países dotados de recursos e economias estruturadas possui uma taxa de juros sequer próxima da que prevalece no Brasil e que o Banco Central pretende manter por longo período.” [i]
Para entendermos um pouco melhor esta questão indigesta da taxa de juros, poderíamos simplificar dizendo que o dinheiro (papel moeda) é ao mesmo tempo um meio de pagamento para compra de produtos, bens e serviços – mercadorias, portanto – assim como ele próprio, dinheiro, também é uma mercadoria. Os juros seriam então o preço que se paga pela mercadoria dinheiro. Sempre que os juros sobem estamos na verdade pagando mais caro pelo dinheiro que tomamos de empréstimo. Isto vale para a dívida pública também, caso em que o tomador de empréstimo é o próprio país que toma emprestado dinheiro do setor financeiro e paga-lhe o preço em forma de juros da dívida.
Assim, trazendo para os últimos acontecimentos, na cerimônia de posse de Aloizio Mercadante como presidente do BNDES, o presidente Lula voltou a criticar os juros altos praticados pelo Banco Central, com taxa de 13,75% definido pelo Comitê de Política Monetária (Copom), questionando os reais motivos para tal prática. Afirmou que essa taxa de juros é uma vergonha e que não há justificativa para mantê-la nesse patamar. O Copom é vinculado ao Banco Central que, por sua vez, tornou-se independente do governo federal desde 2021.
A autonomia do Banco Central sempre foi questionada pelos líderes progressistas e especialistas na matéria por entenderem que isso contribui para que o mercado financeiro exerça controle inaceitável sobre as políticas públicas e acarreta a redução das possibilidades de crescimento econômico.
Recessão, inflação e desemprego estão à vista no Brasil, pressionando a governabilidade de Lula. Entretanto, juros altos só contribuem pra piorar o quadro porque os capitalistas preferem aplicar seu capital na bolsa ao invés de aplicar na economia real. São os descalabros do sistema capitalista que vive saltando de crise em crise, sendo essa última ainda decorrente de 2008, na qual o sistema financeiro mundial entrou em colapso, momento em que os bancos centrais dos maiores países emitiram volumes absurdos de dinheiro para salvá-lo da quebradeira.
Desta forma, o argumento de manutenção de juros altos para a contenção das taxas de inflação futuras, é sempre o mesmo. Este perpassa pela teoria de que aumentando a taxa de juros os investidores passariam a poupar, retraindo a economia com a desaceleração do crescimento da produção. No entanto, dados os acontecimentos dos últimos anos – leia-se pandemia e o desastroso governo Bolsonaro – a economia do país está estagnada, não há renda e a produção ainda está em reaquecimento. Assim, a manutenção da taxa de juros tão alta irá potencializar este processo, do ponto de vista macroeconômico. Em outras palavras: o grande capital ao poupar (ao invés de investir) atrapalhará qualquer tentativa de reaquecimento da economia real, aquele que realmente locomove as forças de produção e de consumo do sistema.
Na luta contra os juros altos, surgiu uma campanha[ii] nas redes sociais que denuncia o fato do Brasil ser o país com a mais alta taxa de juros real do mundo. A campanha informa que os maiores prejudicados são as pessoas de baixa renda porque os juros altos constituem a maior causa de endividamento das famílias brasileiras que utilizam o crédito inclusive para comprar alimentos. Uma vez que a chamada taxa Selic (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia), que representa a taxa básica de juros estabelecida para toda a economia está em alta, ela interfere em todas as outras taxas de juros praticadas na vida real: cartão de crédito, empréstimos, cheque especial, financiamentos. Tais dívidas, inclusive dos empréstimos vinculados ao antigo Auxilio Brasil, ilustram o grau de endividamento que hoje atinge 77,9% das famílias brasileiras e bateu recorde em 2022.[iii]
Verifica-se que sempre que os juros sobem a dívida pública brasileira cresce junto e é o próprio Banco Central quem afirma que a cada 1 ponto percentual que se eleva na taxa Selic a dívida pública bruta cresce R$ 35 bilhões, causando forte impacto nas contas públicas. Obviamente os rentistas e acionistas do sistema financeiro, que vivem de comprar títulos da dívida pública, se banqueteiam com isso.
Uma questão importante que se correlaciona com esse embate sobre juros tem a ver com a Reforma Tributária anunciada pelo governo Lula. O chilique do mercado com a fala de Lula tem muito a ver com o receio de que tal reforma poderá (assim esperamos) implicar numa maior tributação dos mais ricos, incluídos aí os acionistas que não pagam Imposto de Renda.
A massa assalariada é quem mais paga impostos. Seja diretamente, pela via dos débitos nos salários, ou indiretamente, pela via dos impostos embutidos nos preços dos gêneros de primeira necessidade. Para arrecadar mais, e assim poder ampliar a faixa de isenção entre os assalariados, é preciso retirar as isenções fiscais de setores como do agronegócio, por exemplo. Ou então criar, e fazer valer, leis para cobrar mais impostos do setor financeiro que é o setor improdutivo que mais enriquece, já que os lucros e dividendos dos acionistas não pagam imposto de renda. Ou ainda, fazendo valer as leis já existentes e cobrando imediatamente (paga ou vai pra cadeia) os grandes devedores de impostos, a exemplo da Havan.[iv]
De qualquer modo, o debate está posto na esfera pública e cabe-nos como militantes, assim como aos grupos sociais organizados, interferir nele, cobrando soluções que sejam do interesse das massas trabalhadoras que são aqueles/aquelas que verdadeiramente produzem as riquezas do país, os que mais pagam impostos e os que mais sofrem com a inflação.
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[i] Fonte: https://www.poder360.com.br/economia/manifesto-de-economistas-cobra-queda-nos-juros-ao-banco-central/
[ii] Fonte: https://www.jurosbaixosja.com/
[iii] Fonte: https://www.cut.org.br/noticias/endividamento-atinge-77-9-das-familias-brasileiras-e-bate-recorde-em-2022-2718
[iv] Fonte: http://www.sindifiscal-es.org.br/noticias/970/luciano-hang-dono-da-havan-sonegou-r-25-milhoes-diz-receita
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Isabel Perez: Assistente Social, professora universitária, mestre e doutora em Educação. Compõe a equipe de redes sociais do Movimento Geração 68.



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